Reajustes perdem força e metade dos trabalhadores fica sem aumento real

Data da postagem: 7/04/2016
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No ano passado, 48% dos trabalhadores não tiveram reajuste salarial real (acima da inflação), piora expressiva em relação a 2014, quando nove em cada dez brasileiros viram seus ganhos subirem mais que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

A alta dos preços, em 2015, chegou a 11,28%, a maior taxa desde 2002 e bastante acima dos 6,23% de 2014. O índice elevado, somado à retração da atividade econômica, impossibilitou avanços maiores dos salários, explica Paulo Dutra, coordenador do curso de economia da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP).

“Como temos menos investimento e mais mão de obra desempregada, as empresas estão sem dinheiro para bancar reajustes superiores e mais gente está disposta a ganhar menos para continuar empregada”, acrescenta o especialista.

Antônio Carlos dos Santos, professor de economia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) ressalta que houve “certa demora” para que o mercado de trabalho sofresse o impacto da recessão. “Isso só está sendo percebido agora, com reajustes menores e aumento do desemprego.” Segundo ele, a tendência é de correções nos salários em patamares mais baixos também em 2016 e no ano que vem.

“Essa diminuição, por outro lado, pode adiantar a redução da taxa de juros [Selic], já que os reajustes menores vão colocar menor pressão sobre os preços nos próximos anos”, complementa Santos.

Entre os reajustes que não superaram o INPC, 29,9% foram iguais e 18,1% ficaram abaixo do índice. Em 2014, 7,3% das correções seguiram o ritmo da inflação e 2,4% foram inferiores ao INPC.

De acordo com Santos, também pesou para que os reajustes fossem menores a incapacidade dos empresários em compensar a queda nas receitas com aumentos nos preços, já que o poder de compra dos brasileiros também caiu. “A alternativa para os patrões acaba sendo um reajuste menor.”

Os especialistas entrevistados pelo DCI destacam também que o aumento do desemprego e a retração econômica também reduzem o poder dos sindicatos, o que afeta as negociações por melhores salários.

Piora durante o ano

Em documento divulgado ontem, o Dieese destaca que as correções perderam força durante os meses de 2015. “À medida que o ano avançava, menos categorias logravam conquistar ganhos reais.”

Em janeiro, 91,3% das negociações terminaram com ajustes acima do INPC. O número despencou para 32,1%, em julho, e chegou a bater os 7,8%, em novembro, antes de encerrar o ano em 28,6%.

Já os acordos abaixo da inflação começaram 2015 em 1,1% e não pararam de subir: em julho, o montante chegou a 25%, em novembro, alcançou 35,3% e, em dezembro, subiu ainda mais, para 42,9%.

“Uma possível explicação para a deterioração dos reajustes salariais ao longo do ano pode ser encontrada no agravamento do quadro econômico nacional, principalmente no que se refere ao comportamento do nível de atividade, da ocupação e da inflação”, indica o Dieese.

Parcelamento

O documento também traz informações sobre o parcelamento de reajustes salariais. Segundo o Dieese, das 708 negociações analisadas, 90 (13%) dividiram o pagamento da correção em duas ou mais parcelas. A proporção registrada no ano passado chega perto do dobro da que foi observada em 2014 e supera o triplo da registrada em 2008.

Sobre os reajustes escalonados – pagos em valores diferenciados segundo faixas salariais definidas em negociação – o Dieese informou que quase um quarto dos pagamentos foi feito desta forma em 2015. “Diferentemente dos reajustes parcelados, que tiveram um salto em 2015, o crescimento no percentual dos reajustes escalonados parece obedecer a uma tendência de vários anos”, aponta o documento.

Quanto ao pagamento de abono salarial, o Dieese comenta que “não se observa mudanças significativas”. Cerca de 7% das negociações analisadas no ano passado concederam abono salarial, “um percentual próximo ao verificado nos últimos anos”.

Setores econômicos

A retração da indústria afetou os reajustes no setor. Apenas 45% das correções resultaram em ganhos reais, 36% foram em valor igual à variação do INPC e 19% ficaram abaixo.

No comércio, as negociações coletivas tiveram um resultado um pouco melhor, com aumentos reais em 53% dos casos e perdas reais em quase 15%. Reajustes iguais ao INPC foram observados em 32% das categorias analisadas no setor.

No setor de serviços notou-se a maior proporção de aumentos reais: cerca de 62% das categorias estudadas obtiveram ganhos acima da inflação. Ainda assim, perdas reais foram observadas num patamar próximo ao do setor industrial: 18%.

Fraqueza econômica e disparada da inflação colaboraram para correções menores nos salários, que se intensificaram durante o ano passado; mais uma vez, indústria foi o setor mais afetado.

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