Sem o reajuste das pensões pelo mínimo, 4 milhões poderão ter benefício reduzido

Data da postagem: 3/01/2017

A desvinculação das pensões por morte do salário mínimo deve atingir mais da metade dos beneficiários do sistema, número próximo de quatro milhões de pessoas. O Valor apurou que 55% das pensões são de até um salário mínimo. Essa é uma das mudanças mais radicais na proposta de reforma da Previdência Social. Em 2015, último dado oficial disponível, havia 7,41 milhões de pensionistas.

A partir da aprovação da reforma, o governo vai editar um projeto de lei para definir como será o reajuste desses benefícios, que deixarão de acompanhar o piso salarial. A tendência é que o valor seja corrigido pela inflação, mas o aumento poderá deixar de ser anual, como atualmente é praticado na correção do Bolsa Família. Com isso, a elevação do benefício passará a ser feita conforme a margem fiscal do governo federal.

Para os novos pensionistas, o valor mínimo da pensão deixará de ser o mesmo que o salário mínimo porque a reforma propõe a divisão do benefício em uma cota familiar de 50% e distribuição do restante entre os dependentes na proporção de 10% para cada um até o limite de 100%, explica Arnaldo Lima, diretor do Departamento de Assuntos Fiscais e Sociais do Ministério do Planejamento. A reforma acaba com a pensão integral para quem perder o cônjuge, criando situações na qual uma viúva, sem filhos, pode acabar recebendo apenas 60% do salário mínimo. Hoje, ela receberia um mínimo.

A regra da cota familiar, assim como o fim do acúmulo de benefício, atingirá apenas novos pensionistas. Porém, a desvinculação do reajuste do mínimo com o estabelecimento de um novo índice de reajuste para as pensões acabará pegando todos os beneficiários.

“Vai dar um valor baseado na composição familiar. Quem tem mais filhos vai receber mais. Como nosso piso será de 60%, ele já está acima das melhores práticas internacionais. Na grande maioria das vezes, o benefício estará próximo do salário mínimo”, disse Lima.

A retirada de cena do salário mínimo como indexador e piso das pensões cria a situação na qual, para receber esse valor, a família precisa ter, além da mãe (ou pai), quatro filhos, por conta da definição de adicional de 10% por dependente. Segundo Lima, a mudança na regra vai, na verdade, elevar a progressividade do sistema.

Hoje, independentemente da quantidade de filhos, a família recebe o mesmo valor, conforme o nível de contribuição do trabalhador – tendo o salário mínimo como piso. Assim, uma família com quatro filhos, que tenha direito ao mínimo como pensão, terá, na prática, um benefício de um quinto desse valor por indivíduo, enquanto uma viúva sozinha recebe a integralidade. O governo tenta diminuir essa diferença por meio da criação do sistema de cotas, que reduz o valor pago a famílias menores. “Estamos aumentando a progressividade do sistema. Hoje uma cota já pode ser menor do que o salário mínimo”, frisa Lima.

Outra justificativa é que o salário mínimo não seria mais um corte definidor da extrema pobreza, situação mais vulnerável e que, para o governo, tem prioridade na definição dos recursos públicos. “Hoje, quem ganha o salário mínimo não está entre os extremamente pobres”, diz Lima. Ele reconhece, porém, a importância do mínimo como indutor da redução da desigualdade nas últimas décadas.

Na avaliação do técnico, a pensão deve ser vista como um seguro para família e não um benefício que substitui renda do trabalhador, que é o caso da aposentadoria, que não pode ser inferior ao salário mínimo. O entendimento é que novo sistema de cota familiar deve ser analisada em conjunto com a rede de proteção social e não somente no âmbito da Previdência.

O governo alega, no entanto, que é preciso fazer mudanças nas regras de concessão para conseguir manter o benefício no futuro diante do cenário em que o gasto saltou de R$ 14,5 bilhões em 2000 para R$ 92 bilhões em 2015. Somente entre 2000 e 2015, a quantidade de pensões por morte cresceu 47,6%. Considerando dados referentes a dezembro de cada ano, o número passou de 5,020 milhões para 7,412 milhões no período.

Uma conta pesada, especialmente diante da prioridade do governo pelo ajuste fiscal. No total, segundo dados da Secretaria de Previdência Social, o INSS desembolsou R$ 32,911 bilhões para pagar 28,361 milhões de benefícios previdenciários em janeiro de 2016. As pensões por morte representaram 26,6% do total de benefícios e 24,6% do valor pago.

Além disso, como os brasileiros estão vivendo mais, a duração média da pensão por morte tem crescido. Em 2005, os homens recebiam o benefício, em média, por 8,9 anos se estivessem na área urbana e 5,5 anos na área rural. No caso das mulheres, a quantidade de anos era de 19,6 anos para quem vivia na área urbana e de 8,8 anos na zona rural. Em 2015, o número de anos subiu para 10,6 no caso dos homens da área urbana e para 9,3 anos para os da área rural. Já as mulheres que viviam na área urbana recebiam o benefício, em média, por 22,3 anos e as da área rural por 16,5 anos.

Para tentar diminuir os gastos com pensões, a reforma da Previdência prevê ainda o fim do acumulo entre pensões e aposentadorias. A partir da aprovação da reforma, o novo beneficiário terá que escolher um deles. Em 2014, do total de 7,379 milhões de pensionistas, 2,395 milhões acumulavam o benefício com a aposentadoria. Em 1992, existiam 3,339 milhões de pensionistas e 330,046 recebiam também a aposentadoria.

Técnicos insistem no argumento de que os critérios para concessão de pensão por morte precisam ser alterados para preservar a sustentabilidade da Previdência Social, alinhar a legislação brasileira às melhores práticas internacionais e corrigir distorções, preservando a rede de proteção social construída nas últimas décadas.

Fonte: Valor Econômico

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